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Estudo revela por que sistemas de Integração Lavoura-Pecuária emitem menos óxido nitroso
Pesquisa mostra como a lavoura integrada com pastagem reduz emissões de gás de efeito estufaOs sistemas de Integração Lavoura-Pecuária (ILP) emitem menos óxido nitroso (N2O), um importante gás de efeito estufa (GEE), quando comparados a lavouras em sistema de plantio convencional. Foi o que constatou um estudo conduzido na Embrapa Cerrados (DF) que também detalha como isso ocorre. A pesquisa destaca que o uso de gramíneas forrageiras, que aportam matéria orgânica e aprofundam raízes no perfil do solo, influencia esse processo, assim como a presença de maiores volumes de agregados do solo com maiores diâmetros.
Entre as explicações para esse resultado, os cientistas observaram que as braquiárias, forrageiras plantadas para alimentar o gado, depositam matéria orgânica mais difícil de ser degradada e, além disso, a ILP proporciona solos com agregados maiores. Com mais carbono e nitrogênio acumulados nessas partículas, a matéria orgânica presente é protegida da decomposição feita pela microbiota, os microrganismos que habitam o solo.
“A tecnologia permite, em uma mesma área, produzir mais e em menor tempo (no caso dos animais) e esses fatores reduzem a intensidade de emissões, ou seja, emitimos menos gases de efeito estufa por quilo de alimento produzido”, detalha o pesquisador da Embrapa Solos (RJ) Renato Rodrigues, que preside o conselho da Associação Rede ILPF. “A integração ainda promove redução proporcional do uso de nitrogênio em comparação aos sistemas solteiros e gera menos revolvimento da terra, o que reduz as emissões de óxido nitroso”, completa o especialista.
Como foi a pesquisa
Pesquisas anteriores já haviam demonstrado que as emissões de N2O nos sistemas agrícolas são influenciadas por condições edafoclimáticas (solo, clima, vegetação, entre outras), e que a disponibilidade de matéria orgânica do solo (MOS) é um fator chave no processo. O estudo avança na compreensão de como se dá o acúmulo de frações de MOS estáveis e lábeis (menos estáveis) nos solos sob ILP e as possíveis relações com as emissões de N2O. As avaliações foram realizadas em 2015, na área do experimento de longa duração em ILP, iniciado em 1991 na Embrapa Cerrados – o mais antigo do Brasil – sob solo argiloso.
O experimento compreende uma área total de 14 hectares (ha). Com dimensões de cerca de um hectare, as parcelas compararam sistemas de lavoura contínua (cultivada em plantio direto e convencional) com sistema integrado de rotação lavoura-pecuária, tendo o capim Brachiaria brizantha BRS Piatã como planta de cobertura. Em todos os três sistemas agrícolas, a espécie forrageira foi introduzida em consórcio com sorgo safrinha cultivado após a soja, visando à comparação das áreas, que receberam o mesmo manejo. Os tratos culturais variaram apenas quanto ao preparo do solo na lavoura contínua sob preparo convencional e à presença dos animais em pastejo no sistema ILP.
“Realizamos esse estudo em um experimento que simula as condições de fazenda, com mecanização em todas as etapas, o que permitiu maior robustez dos dados”, explica o pesquisador da Embrapa Robélio Marchão, atualmente responsável pela área experimental.
Brasil e o compromisso
com o clima
O pesquisador da Embrapa Renato Rodrigues lembra que o Brasil assumiu compromissos voluntários de mitigação de emissões junto à Organização das Nações Unidas (ONU), durante a Conferência de Mudança do Clima de 2009. “Esses compromissos foram traduzidos em uma grande estratégia de adoção de tecnologias sustentáveis (ou de baixa emissão de carbono). A partir dessa política, teve origem o Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura (Plano ABC), que entre outras tecnologias, previa a implantação de quatro milhões de hectares de ILP/ILPF no Brasil entre 2010 e 2020”, diz.
Em 2015, o Brasil assumiu novos compromissos no Acordo de Paris, com a intenção de implantar mais 20 milhões de hectares de ILPF e recuperação de pastagens degradadas entre 2021 e 2030.
As maiores emissões acumuladas ao fim dos 146 dias foram observadas na área com lavoura em plantio convencional, com 1,8 kg/ha de N2O, enquanto as emissões da lavoura contínua sob plantio direto representaram metade dessa emissão (0,9 kg/ha). Entre as áreas cultivadas, o sistema ILP foi o que apresentou as menores emissões acumuladas de N2O, com 0,79 kg/ha. Na área de Cerrado, considerada a referência positiva do estudo e onde as emissões diárias estão sempre próximas de zero, a emissão acumulada do período representou apenas 11% da emissão da lavoura em plantio convencional, considerada a referência negativa.Os cientistas quantificaram as emissões cumulativas de N2O por 146 dias ao longo do ciclo da cultura do sorgo. Uma área remanescente de Cerrado também foi avaliada como referência. As emissões acumuladas foram maiores no início do ciclo da cultura, em função da fertilização nitrogenada associada à ocorrência de chuvas, com precipitações diárias superiores a 40 mm. “Além disso, a ocorrência de veranicos (períodos sem chuva) na estação chuvosa no Cerrado promove condições de secagem e reumedecimento do solo, o que funciona como uma fonte importante para emissão de N2O em diferentes momentos da estação de crescimento dos cultivos”, explica a pesquisadora Alexsandra de Oliveira.
“A decomposição de resíduos da lavoura durante a sucessão de culturas na primeira e na segunda safras (soja e sorgo) e a presença de uma gramínea forrageira com e sem pastejo nos dois sistemas em plantio direto explicam as diferenças nos fluxos de N2O nos diferentes sistemas de manejo analisados”, relata a pesquisadora Arminda de Carvalho.
“As gramíneas forrageiras tropicais, sobretudo as braquiárias, quando encontram solos de fertilidade construída, como é o caso desse estudo, conseguem expressar todo o potencial de desenvolvimento do seu sistema radicular, que tem um importante efeito físico no solo, protegendo a MOS”, completa Marchão.
Cultivo convencional aumentou emissões
A pesquisa também analisou as frações de carbono do solo lábeis e estáveis em duas classes de agregados de solo – os macroagregados, com mais de 0,250 mm de diâmetro, e os microagregados, com menos de 0,250 mm de diâmetro. Nos macroagregados, foram encontradas as maiores proporções de MOS estável.
Os pesquisadores constataram que o cultivo convencional com revolvimento do solo reduziu todas as frações de carbono do solo, diminuiu a proteção física da matéria orgânica e o índice de humificação (formação de húmus) da MOS e, consequentemente, aumentou as emissões de N2O para a atmosfera.
Já o sistema ILP resultou no maior incremento em carbono do solo nas frações mais estáveis de MOS. Para os responsáveis pelo estudo, isso confirma a hipótese de que o acúmulo de carbono e nitrogênio nas frações mais estáveis de MOS, ao oferecer proteção física e química contra a ação de decomposição pela microbiota do solo, resulta em menores emissões de N2O.
“No sistema ILP, a MOS depositada pelas braquiárias é mais estável e mais difícil de ser degradada”, esclarece Marchão. Assim, os pesquisadores constaram que a compreensão do papel das frações de MOS é fundamental na busca pela mitigação dos gases de efeito estufa e na adaptação dos sistemas agrícolas às mudanças climáticas.
Os cientistas concluíram, ainda, que a agregação é um atributo-chave que se correlaciona com os fluxos de N2O dos solos. Eles observaram que sistemas conservacionistas como ILP em plantio direto obtiveram maior diâmetro médio de agregados do solo entre os agroecossistemas analisados. Também constataram que a difusividade do oxigênio no perfil do solo, possibilitada pela formação de agregados, resultou na diminuição da emissão de N2O, o que também explica as menores emissões no sistema ILP.
Para os autores do estudo, os resultados mostram que os sistemas integrados apresentam potencialmente um balanço de carbono positivo, o que torna possível recomendá-los para a intensificação sustentável como alternativa para a mitigação e adaptação das mudanças climáticas.
Sistemas de integração e o N2OOs sistemas de integração baseados na rotação pastagem-lavoura associada ao Sistema Plantio Direto têm sido importantes na intensificação sustentável do uso da terra no Brasil. Eles são mais eficientes na reciclagem de nutrientes, melhorando a qualidade do solo e aumentando a sua biodiversidade. Além disso, como já comprovado pela pesquisa, promovem sequestro de carbono, contribuindo para a mitigação das emissões de GEE. As menores emissões de óxido nitroso por esses sistemas podem ser explicadas pela capacidade das raízes dos capins braquiárias de liberarem inibidores biológicos de nitrificação, que bloqueiam as rotas enzimáticas das bactérias do gênero Nitrossomonas, responsáveis pela oxidação da amônia, transformando-a em nitrito. O nitrito sofre nitrificação pelas bactérias Nitrobacter, tornando-se nitrato. O nitrato é então reduzido a gases de nitrogênio, entre eles o N2O, na desnitrificação promovida por bactérias heterotróficas. Nas áreas com ILP, há uma maior mobilização de nitrogênio pelas pastagens na entressafra de grãos, o que reduz a disponibilidade desse elemento químico para a biomassa microbiana responsável pelos processos de nitrificação e desnitrificação. Apesar de estar presente em proporções bem menores que o gás carbônico (CO2), o N2O possui capacidade cerca de 300 vezes maior que a do CO2 de reter calor na atmosfera. Além disso, pode absorver calor em lugares nos quais o CO2 preferencialmente não absorve, permanecendo por mais de 100 anos na atmosfera até ser degradado naturalmente. O Brasil é considerado o principal emissor de N2O da América Latina. As emissões do gás são influenciadas por uma série de fatores, como: manejo; elevada quantidade de água dos solos, que reduz a aeração e promove a anaerobiose; acidez do solo; o uso de fertilizantes nitrogenados; o plantio convencional, que interfere na aeração, na decomposição dos resíduos vegetais e na flora; e os excrementos de animais, que são fontes de nitrogênio e de carbono orgânico, que favorecem a atividade microbiana. |