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Sistema baseado em pastagens de alta performance aumenta produção pecuária
Método se baseia no uso de diferentes forrageiras, consórcio com leguminosas, controle preventivo de plantas daninhas e manejo adequado do pasto.Composto por tecnologias de baixo impacto, o Sistema Guaxupé permite intensificar a atividade pecuária, com menor investimento econômico e benefícios para o meio ambiente. Desenvolvido pela Embrapa, em parceria com pecuaristas do Acre, esse modelo de produção orienta estratégias para a obtenção de pastagens com alta produtividade de forragem de qualidade e de longa duração, que elevam a rentabilidade de sistemas pecuários a pasto. Resultados de pesquisas confirmam aumento de 30% na produtividade de carne e de bezerros, por hectare, e redução nas emissões de gases de efeito estufa na atividade.
Indicado para solos sem aptidão para a agricultura, devido à baixa capacidade de drenagem, o Sistema Guaxupé utiliza tecnologias e práticas gerenciais sustentáveis para a produção pecuária intensiva a pasto. Resultado de 25 anos de pesquisa e recomendado para as condições ambientais específicas do Acre, o modelo se baseia no uso de diferentes forrageiras para diversificar e manter as pastagens produtivas; consórcio de forrageiras com leguminosas capazes de fornecer nitrogênio para o solo; controle preventivo de plantas daninhas, para reduzir gastos com reforma; e manejo adequado do pasto, para garantir a oferta contínua de forragem para o rebanho.
Lançamento da tecnologia
O Sistema Guaxupé será lançado em evento realizado na Fazenda Guaxupé, em Rio Branco (AC). Resultados de pesquisas e experiências de pecuaristas parceiros serão apresentados a produtores rurais, técnicos de instituições de apoio à produção pecuária, estudantes de graduação e gerentes de casas agropecuárias nesta quarta-feira, 21 de junho.
A capacidade gerencial de cada produtor é determinante no processo de adoção das tecnologias. Quando bem implantado, ao mesmo tempo em que melhora a produtividade e rentabilidade na atividade pecuária, o sistema assegura serviços ecossistêmicos fornecidos pelas pastagens consorciadas com leguminosas, como ciclagem de nutrientes e sequestro de carbono. “A sua adoção em larga escala é uma alternativa para tornar a pecuária a pasto mais sustentável na Amazônia e pode contribuir para a abertura de novos mercados nacionais e para inserir a carne produzida no Acre em mercados internacionais que buscam uma produção mais limpa”, avalia Andrade.
Diversificação inteligente de forrageiras
Estudos confirmam que pastagens cultivadas podem se manter produtivas por muitas décadas, mas para alcançar essa longevidade é necessário investir na diversificação inteligente de forrageiras. A escolha das cultivares deve ser criteriosa e priorizar espécies adaptadas às condições locais do solo e do clima da propriedade rural e levar em consideração fatores como pragas e doenças existentes na região e características do rebanho que utilizará a pastagem. O Sistema Guaxupé recomenda utilizar diferentes opções de forrageiras indicadas pela pesquisa para a região, na formação das pastagens, e ocupar cada metro quadrado do solo.
Conforme Andrade, outra orientação é dar preferência para forrageiras estoloníferas, por apresentarem alta tolerância ao encharcamento ou alagamento do solo. Além disso, como essas forrageiras se reproduzem por meio de caules (estolões) que enraízam nos nós, conseguem se alastrar na pastagem e colonizar espaços descobertos no solo e competir com plantas daninhas, característica que assegura a sua persistência. O resultado são pastos biodiversos duradouros e sustentáveis, que não demandam investimentos periódicos em reforma, especialmente em solos mal drenados”, afirma o cientista.
Estudos de zoneamento edafoclimáticos mostram que mais de 80% das áreas com pastagem no Acre apresentam solos pouco permeáveis e com baixa capacidade de drenagem. O encharcamento do solo causa deficiência de oxigênio nas raízes das plantas, que ficam sujeitas ao ataque de patógenos responsáveis pela Síndrome da Morte do Braquiarão (SMB), principal fator de degradação de pastagens na Amazônia. Desde o surgimento dessa doença no Acre, em meados da década de 1990, a Embrapa investe em programas de melhoramento genético de forrageiras para selecionar e recomendar novas cultivares para o bioma, adaptadas ao encharcamento.
“Já testamos e recomendamos dez cultivares de gramíneas e quatro espécies de leguminosas – incluindo duas cultivares de amendoim forrageiro (Arachis pintoi) – com excelente ou boa adaptação à Síndrome da Morte do Braquiarão. Os capins tangola, humidícola e a grama-estrela-roxa são os mais indicados para formação de pastagens em solos com alto risco de alagamento”, informa o pesquisador.
Pastagens autossuficientes em nitrogênio
A consorciação de gramíneas com leguminosas forrageiras, que fornecem nitrogênio para o solo, é uma estratégia eficiente para manter a produtividade e assegurar vida longa às pastagens. Pesquisas realizadas no Acre e em outras regiões do Brasil mostram que pastos formados somente com gramíneas precisam de reposição anual de nitrogênio, via adubação química, para se manter produtivos. O amendoim forrageiro é a leguminosa mais indicada para o consórcio de pastagens no trópico úmido brasileiro e o carro-chefe no processo de intensificação pecuária no Sistema Guaxupé.
De acordo com Giselle Lessa, coordenadora do Programa Nacional de Melhoramento do Amendoim Forrageiro, a planta consegue capturar nitrogênio do ar e fixá-lo no solo, pela associação com bactérias em suas raízes, e pode ser consorciada com diferentes tipos de gramíneas. O consórcio com essa leguminosa garante à pastagem autossuficiência em nitrogênio, melhora a fertilidade do solo, aumenta a produção de forragem e contribui com o processo de descarbonização da pecuária brasileira. Além de proporcionar um aporte natural desse nutriente essencial para o desenvolvimento das plantas, o amendoim forrageiro possui teor médio de proteína bruta de 22% e alta digestibilidade, aspectos que elevam a qualidade nutricional da dieta do rebanho.
“Modelos pecuários de produção intensiva que se baseiam na associação de gramíneas e leguminosas forrageiras bem adaptadas, produtivas e economicamente viáveis, fornecem aos animais os nutrientes necessários para a produção de carne e leite, reduzem custos com adubação nitrogenada, proporcionam economia para o produtor rural e ganhos em produtividade, e conferem maior competitividade à atividade pecuária”, ressalta a pesquisadora.
O pesquisador da Embrapa Acre, Judson Valentim, explica que o uso de gramíneas consorciadas com amendoim forrageiro possibilita suprir a necessidade de nitrogênio nas pastagens, a baixo custo, e favorece produtores de regiões mais distantes, especialmente do Norte do País, que compram fertilizantes nitrogenados a preços elevados e enfrentam dificuldades na logística para aquisição.
“Pastagens consorciadas com amendoim forrageiro alcançam eficiência máxima quando a presença da leguminosa representa de 20% a 40% da massa de forragem. Nessas condições, em pastos manejados de acordo com recomendações técnicas, a planta consegue incorporar até 150 quilos de nitrogênio na pastagem, o equivalente a 330 quilos de ureia por hectare ao ano. Entretanto, para consolidar o consórcio com essa leguminosa são necessários em torno de quatro a cinco anos. É preciso que o produtor esteja ciente de que a adoção desta e de outras tecnologias que compõem o Sistema Guaxupé requer investimento, trabalho e paciência. Os resultados são de médio e longo prazos, porém, altamente compensadores”, enfatiza.
Tolerância zero com plantas daninhas
Pecuaristas que adotam o Sistema Guaxupé utilizam uma estratégia proativa no manejo de plantas daninhas, que garante a manutenção de pastagens sempre “limpas”. O trabalho inclui o monitoramento rotineiro das áreas, para controlar os focos iniciais de infestações e prevenir a sua proliferação. As medidas de controle envolvem aplicação localizada de herbicidas seletivos ou catação mecânica (enxada), para preservar as forrageiras. De forma complementar, os produtores realizam o replantio nas falhas das pastagens, com mudas de forrageiras estoloníferas.
“Para manter o alto desempenho das pastagens biodiversas é essencial adotar tolerância zero com plantas daninhas, por meio de uma postura vigilante. A adoção de medidas preventivas resulta em pastagens mais produtivas e com custo de manutenção decrescente, já que essas áreas ficam cada vez menos propensas a reinfestações”, diz Andrade, que acrescenta, ainda, que esses cuidados também beneficiam o meio ambiente, na medida em que reduzem o uso de herbicidas.
Pasto bem manejado e gado bem alimentado o ano todo
Além da diversificação de forrageiras, uso de leguminosas e manejo efetivo de plantas daninhas, o Sistema Guaxupé tem como pilar o manejo adequado das pastagens, por meio de técnicas que levam em consideração características da fazenda, do rebanho e dos pastos formados. Para manejar bem as pastagens é necessário conhecer o seu funcionamento, em especial o impacto do pastejo na produtividade e estabilidade das forrageiras, no consumo de pasto e no desempenho produtivo do rebanho. Como a produção e a qualidade do pasto variam durante o ano, o sistema recomenda planejar os ajustes de lotação da pastagem.
“O bom manejo também exige observar a altura e estrutura dos pastos para realizar as adequações necessárias em cada módulo de pastejo rotacionado, como tempo de pastejo e descanso, remanejamento de piquetes e outros cuidados que influenciam o consumo da forragem e a produtividade animal. Também é importante planejar estratégias de gerenciamento do rebanho, época da estação de monta e o descarte de animais no período mais propício para adequar a demanda de alimento do rebanho à oferta de forragem. Esses cuidados, aliados a estratégias de suplementação, ajudam a manter o rebanho bem alimentado durante os 365 dias do ano, com redução de custos e manutenção da produção”, orienta Valentim.
Fazendas-referência
O produtor Luiz Augusto Ribeiro do Vale, proprietário de duas fazendas-referência no Sistema Guaxupé, em Rio Branco, conta que com a adoção gradativa das tecnologias foi aprendendo a fazer pecuária de maneira planejada. Durante muito tempo realizou o processo de formação de pastagens de forma aleatória e ouviu de muitos profissionais que o consórcio com leguminosas era inviável. Ele conta que a parceria com a Embrapa mostrou que a técnica é possível e rentável e proporciona alto rendimento e estabilidade à pastagem e aumento na produção de arrobas por hectare e no lucro da atividade.
“Começamos com a puerária e depois incluímos o amendoim forrageiro. A planta se consolidou e hoje temos pastagens consorciadas com mais de vinte anos, que se mantêm produtivas, com taxa de lotação de até três unidades animal (UA) por hectare, média considerada excelente para a região. Esse resultado é fruto dos cuidados com o manejo e manutenção das pastagens consorciadas, que possibilitam manter uma boa distribuição da oferta de forragem para o gado, aliados à adoção de estratégias de suplementação que ajudam a potencializar a qualidade da dieta bovina e o ganho de peso dos animais”, destaca.
Outro produtor parceiro, o pecuarista Francisco Sales, iniciou a adoção das tecnologias do Sistema Guaxupé quando percebeu a degradação nas pastagens de sua fazenda, no município de Bujari (foto acima), devido à morte do capim braquiarão, em 1998. Ele considera que, graças às orientações recebidas de pesquisadores da Embrapa, fez a escolha certa das gramíneas e leguminosas para substituir as pastagens acometidas pela Síndrome da Morte do Braquiarão.
“O amendoim forrageiro combina muito bem com gramíneas estoloníferas, formando pastagens com rendimento produtivo excepcional. Mantemos o rebanho bem alimentado e o ganho de peso animal supera em 30% o obtido em pastagens tradicionais, resultado que paga qualquer investimento. Além disso, com o consórcio temos uma melhoria contínua na qualidade dos solos da propriedade, devido ao aporte de nitrogênio disponibilizado pela leguminosa”, ressalta.
Atendimento aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
Por recomendar práticas agropecuárias que permitem aumentar a produtividade e a sustentabilidade da bovinocultura de corte em fazendas de pequeno, médio e grande porte, com baixo investimento em insumos e reduzida pegada de carbono, o Sistema Guaxupé atende aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 2 (Fome Zero e Agricultura Sustentável), 12 (Consumo e Produção Responsáveis) e 13 (Ação contra a Mudança Global do Clima), que integram 17 metas globais definidas pela Organização das Nações Unidas (ONU). A Embrapa contribui com o alcance dos ODS por meio de ações de pesquisa desenvolvidas nas cinco regiões do Brasil.
Potencial de uso do sistema
O Sistema Guaxupé foi idealizado para atender a particularidades da bovinocultura de corte do Acre, quanto à predominância de solos mal drenados, e sem aptidão para a agricultura intensiva, e às relações de troca menos favoráveis da carne bovina com fertilizantes, rações e outros insumos da produção. O estado tem cerca de 23 mil estabelecimentos rurais envolvidos nas diferentes etapas do processo de produção na pecuária de corte (cria, recria e engorda) e uma demanda crescente por tecnologias sustentáveis para melhoria da eficiência nessas atividades, fatores que também confirmam o potencial de uso do sistema.
Na opinião de Marcos Roveri, gerente-executivo da Unipasto, empresa parceira da Embrapa nas pesquisas com forrageiras há mais de 20 anos, o atual cenário da pecuária no Acre e outros estados brasileiros impõe a necessidade de inserção de sistemas ancorados na diversificação de pastagem, fixação biológica de nitrogênio e outras estratégias de produção sustentável.
“O Brasil possui, aproximadamente, 120 milhões de pastagens cultivadas, com baixa diversidade de espécies forrageiras. Mais da metade dessa área (60%) é plantada apenas com o capim brachiaria brizantha, cultivar Marandu, altamente suscetível à Síndrome da Morte do Braquiarão. Além disso, 90% da carne produzida no País ainda é oriunda de sistemas extensivos. Diversificar essas pastagens, combinando diferentes tipos de gramíneas e leguminosas, adaptadas a cada região, é uma forma de conferir maior sustentabilidade aos sistemas de produção, com conservação ambiental,” declara o gerente.
As fazendas parceiras no desenvolvimento do sistema funcionam como vitrine para demonstração das práticas e tecnologias sustentáveis desse modelo de produção. Nesses espaços de compartilhamento de saberes realizamos cursos, dias de campo, oficinas e outras atividades técnicas com diferentes públicos, incluindo produtores rurais, técnicos de empresas de assistência técnica públicas e privadas e pesquisadores do Acre, de outros estados e do exterior.
“As experiências dos pecuaristas, especialmente com pastos consorciados com leguminosas, mostram que é possível produzir de forma sustentável. Para ampliar a adoção do Sistema Guaxupé vamos intensificar a agenda de capacitações, já em andamento, com abordagem individual para cada tecnologia. Esse trabalho conjunto com instituições de assistência técnica e gerencial, públicas e privadas, e programas de apoio e fortalecimento da produção pecuária do estado, busca formar multiplicadores desses conhecimentos”, afirma o chefe-adjunto de Transferência de Tecnologia da Embrapa Acre, Daniel Lambertucci.
Produção de baixo carbono
Entre os benefícios ambientais do Sistema Guaxupé está a redução das emissões de gases de efeito estufa proporcionada pela consorciação de pastagem com o amendoim forrageiro. Ao disponibilizar nitrogênio para o solo, a planta reduz o uso de adubação química nas pastagens e contribui para minimizar as emissões de carbono na produção industrial.
As pesquisas comprovam, ainda, que a leguminosa também ajuda a diminuir as emissões de metano, na medida em que acelera o ganho de peso do rebanho. “Em sistemas convencionais de pecuária de corte, com abate do boi gordo com 18 arrobas, aos três anos, a emissão de metano por animal, nesse período, corresponde a, aproximadamente, 530 gramas por quilo de carne produzida. Em sistemas intensivos com pastagens consorciadas com a leguminosa, dependendo da genética do animal, essas emissões reduzem entre 17% e 33%, em função do potencial de ganho de peso de cada raça”, explica Valentim.